1. Os eleitores NÃO elegem primeiros-ministros. A sua nomeação cabe ao PR e nem sequer lhe é constitucionalmente exigido que nomeie o presidente/secretário-geral do partido mais votado. Pode não ser do partido mais votado e pode não ser o seu líder. Insistir neste confronto (JS/MFL) é manipulador e constitui fraude constitucional.
2. Os eleitores determinam a composição parlamentar e, com as suas escolhas, condicionam os equilíbrios político-partidários. Se derem a vitória ao PS ou ao PSD só estão a sinalizar ao PR (que leva em conta os resultados eleitorais) que querem esse PARTIDO a chefiar o executivo, não o político A ou o líder B. E se, ao contrário da actual composição de maioria monopartidária, quiserem uma composição mais variada, isso também tem um significado político!
3. Um governo é um órgão colegial e, como tal, NÃO se esgota no primeiro-ministro. Portanto, o escrutínio final faz-se a TODO o governo (o que, no caso presente, inclui Mário Lino, Lurdes Rodrigues, Pinto Ribeiro, Jaime Silva, Manuel Pinho, Alberto Costa, Santos Silva e os outros). A avaliação até, por hipótese, pode ser positiva para o primeiro-ministro, mas a avaliação global de todas as pastas e todas as políticas ser negativa.
4. Se o que acabei de escrever é verdadeiro para o governo que vai ser escrutinado, também o é para o governo que lhe vai suceder, seja ele chefiado por quem for. É uma EQUIPA e deixar de votar num partido porque o seu líder não é simpático ou jovem ou bem-falante é desprezar programas eleitorais, é ignorar o escrutínio ao actual governo, é tornar as eleições legislativas numa escolha de primeiros-ministros, o que é, no limite, inconstitucional (aliás, se não erro, só existe essa possibilidade em Israel, onde se vota separadamente para o líder do governo e para os deputados do parlamento).
5. Outras imprecisões, de cariz menos político-constitucional e mais político-partidário:
a) As “arquitecturas financeiras que inventou para esconder o desastre financeiro” que [MFL] herdou e condicionaram todo o período de 2002/2004. Ou estamos, afinal, com memória selectiva? Já nos esquecemos em que circunstâncias ocorreram as eleições de Março de 2002? Convocadas após a demissão (quase inédita, tirando o caso de Pinto Balsemão nos idos 80) de um primeiro-ministro e foram consequência do início da crise interna que hoje vivemos (sim, o país está em crise há pelo menos oito anos).
b) O “sistema de avaliação muito mais injusto e ineficaz do que este que agora existe”? Mas ele é precisamente o mesmo (SIADAP), criado em 2004 e apenas “retocado” em 2007! Não devemos falar do que não sabemos… Ele não é nem mais justo nem mais eficaz agora do que a sua versão original, tendo apenas aperfeiçoado a fase da auto-avaliação, mudado o nome das menções qualitativas e dos limites das quantitativas e “repristinado” a Comissão Paritária, tudo, afinal, coméstica. As quotas permanecem.
c) Sobre “a tomada de assalto a todos os lugares de topo da Administração Pública” não me pronuncio porque não noto diferenças significativas entre o passado e o presente (sei do que falo pelo menos há 15 anos) e não tenho filiação partidária, por isso não acho que se os dirigentes de topo forem rosas são bons e se forem laranjas são maus (ou vice-versa)… Acho é que só poderá fazer essa crítica quem tiver mostrado pública e veemente indignação também com o “saneamento” (para usar a sua expressão) de dirigentes de topo qualificados e competentes pelos actuais ministros.
Por hoje chega. Vamos ajudar a qualificar melhor os eleitores com comentários e opiniões mais rigorosos e pedagógicos, mesmo que traduzam legitimamente as nossas convicções ideológicas ou simpatia partidárias?
(Núncio, comentário a "Memória", Luís Novaes Tito, Eleições 2009, 21-6-2009)