Terapia política. Introspecção psicossocial. Análise simbólica.

27 novembro 2005

[72] Parece que se esqueceram da Sr.ª Justiça

" (...) O que nós, juízes, exigimos é ser tratados como aquilo que somos e representamos. E que fique isto muito claro: não é um desejo negociável, mas uma exigência incontornável.
" (...) Venham pretensos opinadores e ouçam isto de vez: os juízes, como todos os cidadãos, não estão nem querem estar acima da lei; mas os juízes, como todos os titulares dos órgãos de soberania, não aceitam estar sem ser de igual para igual com os restantes órgãos de soberania".
(J. M. Nunes da Cruz, Presidente do STJ, VII Congresso dos Juízes Portugueses, 24-11-2005)
Pois, parece que os engenheiros se esqueceram que os tribunais são um órgão de soberania e pilar essencial do Estado de Direito.
É assombroso ver grupelhos de jovens recém-licenciados, arregimentados para gabinetes ministeriais por critérios noturnos e convicções côr-de-rosa, a legislarem sobre férias judiciais, regime da aposentação ou sub-sistemas de saúde, numa sanha contra a essência do regime: a separação de poderes e a independência dos órgãos.
E não se pode exterminá-los?


[71] As plumas caprichosas

"Como [Américo] Tomás, Soares anunciou que estava cansado e que bastava de responsabilidades institucionais. Como Tomás, Soares sabe que é o último elo da continuidade, aquele que quer impedir o reconhecimento do óbvio. Como ao lado de Tomás, também ao lado de Soares estão as forças apostadas na continuidade, que querem fechar a última janela de oportunidade para a correcção de rota, desde que isso lhes prolongue por alguns dias os privilégios que apropriaram e que não justificaram. Compreende-se o desespero, mas não se pode ignorar que foi Mário Soares, no fim do seu segundo mandato, em 1995, quem entregou (de modo deliberado e sistemático, mas inglório) todos os poderes institucionais aos protagonistas do Partido Socialista e que foram eles que conduziram a sociedade, a economia e o sistema político ao ponto de ruptura actual. Entregar ao mesmo pecador a tarefa da redenção e a atribuição das penitências não é só uma imprudência, é uma inutilidade".
(Joaquim Aguiar, in Atlântico, 21-11-2005)
Por vezes, as forças conservadoras estão, por muito paradoxal que pareça, numa certa "Esquerda-champanhe e caviar", a quem não convém nada a perda de privilégios "adquiridos". Depois, há também uma certa "Direita-trauliteira" a quem convém muito, como do pão para a boca, a subsistência destes elementos anacrónicos e circenses.

26 novembro 2005

[70] Early evening

«Há tempo para nascer e tempo para morrer; tempo para plantar e tempo para arrancar o que se plantou; tempo para matar e tempo para dar vida;
(...) tempo para a guerra e tempo para a paz».
(Eclesiastes, Antigo Testamento)

[69] Uma questão de sabonete para a pele...

Nem os eleitores vão, felizmente, atrás de conceitos indeterminados e retórica parlamentar, a julgar pela sondagem do "Público" desta semana.
Veja-se bem em que lugar, nas qualidades que os portugueses querem ver no Presidente da República, aparecem a dita sensibilidade (e, já agora, a provecta simpatia).
Ao invés, as duas características mais comummente apontadas a CS são a 1.ª e 3.ª votadas.
Recordo:
1.ª - honestidade (58%);
2.ª - bom senso (41%);
3.ª - competência técnica (33%);
4.ª - capacidade de liderança (32%);
5.ª - experiência (31%);
6.ª - sensibilidade aos problemas sociais (31%);
7.ª - simpatia (14%).

[68] Insensível, gritou ele!

«Soares considera que Cavaco Silva é um "homem com talento e grande conhecimento das coisas económicas", mas falta-lhe "sensibilidade social para defender os direitos, garantias e liberdades dos portugueses num momento em que isso possa estar em causa", (...) sublinhando não acreditar que Cavaco Silva esteja em condições para promover um "desenvolvimento sustentável, o qual está dependente de uma forte componente social e ambiental"».
(DN, 26-11-2005)
Pese embora o talento económico, não terá sensibilidade social. Mas não foi o seu governo, com MS na PR (sancionando muitas decisões políticas), que se viveram os melhores anos de crescimento economico e social e desenvolvimento humano?
Vejam no: http://photos1.blogger.com/blogger/6825/185/1600/HDI.jpg (cortesia do Pulo do Lobo).
Esta discussão sobre as três décadas da III República não estava já encerrada? Ainda alguém tem dúvidas?

[67] Ser do contra é não ser

«Estando adquirida essa convicção [de que Cavaco Silva ganhará], apesar dos silêncios e do carácter vago das posições de Cavaco, é a débil performance de Soares entre o eleitorado de esquerda (e, particularmente, do PS) que parece mais relevante. Soares faz lembrar Walesa - que, de herói nacional polaco, se transformou numa figura historicamente anacrónica. Os clamorosos erros estratégicos da sua campanha, cuja única e suposta originalidade se resume a ser contra Cavaco, têm tido um efeito de boomerang que favorece não apenas Alegre como o próprio candidato da direita. Mas esses erros fragilizam também a direcção do PS, por mais sibilinos que tenham sido os cálculos políticos de Sócrates, junto do eleitorado socialista.
Entre o triunfo anunciado de Cavaco (e sabe-se como é forte a atracção de estar com os vencedores) e o pesado anacronismo da candidatura de Soares, percebe-se que o eleitorado de esquerda não motivado por candidaturas meramente partidárias (Jerónimo ou Louçã) aposte no romantismo "positivo" de Alegre. Ser apenas "contra" já não é mobilizador».
(Vicente Jorge Silva)
O que lamento, acompanhando aqui VJS, é que tudo isto era escusado. MS é uma figura que, pelo seu notável passado político (embora com mais relevo para o regime nos anos 70 do que nos seguintes), merecia ser preservada e deveria ter-se preservado. Até para não se tornar, como o jornalista bem nota, no Walesa português (ou, de uma outra forma, no Mitterrand lusitano) ...
Mais uma vez se demonstra aqui que recorrer sempre à mesma figura nacional empobrece a história da democracia, do Estado e do próprio visado. Queima tudo à volta!
P.S. Uma nota final: essa necessidade de vir (in)esperadamente a terreiro contra Cavaco Silva resulta do quê? Já alguém demonstrou (incluindo o Pai da Pátria) que perigos advirão da vitória do "simples economista"?

[66] Percebem?

"Mas esses ataques [a Cavaco Silva] já não se justificam no plano político, sobretudo a partir do momento em que Mário Soares conseguiu o essencial, que é a realização de um debate televisivo com Cavaco Silva", afirmou o responsável, adiantando que o candidato já concordou com a mudança estratégica. O frente-a-frente entre Mário Soares e Cavaco Silva vai decorrer a 20 de Dezembro, sendo transmitido pela RTP".
É triste ver um ex-Presidente da República a mendigar um debate. Afinal, a estratégia do adversário mantém-se inalterada. Aquela que era supostamente brilhante é que vai ser mudada. E, provavelmente, o debate não alterará coisa nenhuma... Tanto barulho por nada!

24 novembro 2005

[65] Quando não há escolha

"Cavaco Silva não é D. Sebastião, graças a Deus. Mas na presente situação do país, do desemprego à (in)justiça, da chacota de que somos objecto no estrangeiro – que eu, infelizmente, já testemunhei – a necessidade de regeneração da vida pública, não nos podemos dar ao luxo de não eleger Cavaco Silva como Presidente de todos os Portugueses".
(Miguel Beleza)
A política é a arte do possível, terá dito alguém que recordo de memória. Não endeusemos, mas também não ridicularizemos os candidatos. São estes e não outros, que não quiseram ou não souberam avançar. Mas, que ninguém tenha dúvidas, há um que, não sendo um mito ("o nada que é tudo") nem um "vulto da História", é o que melhor assegura o exercício rigoroso, isento, suprapartidário, nacional, daquela arte.

[64] O lado certo

« (...) apesar de a maioria dos portugueses achar que é Mário Soares quem tem melhor hipóteses de contrariar a vitória de Cavaco Silva, a situação é-lhe muito pouco propícia. À parte a possibilidade de roubar eleitores ao próprio Cavaco Silva, que não pode ser excluída (Cavaco parte de um ponto tão alto que dificilmente poderá subir, apenas descer), o potencial de crescimento do eleitorado de Soares à esquerda parece depender em grande medida da captação de pessoas que, a esta hora, já serão dificilmente convertíveis:
- os que já dizem à partida que não tencionam votar, especialmente o eleitorado desmobilizado do PS;
- e os eleitores de Manuel Alegre, maioritariamente compostos por pessoas que declaram tencionar votar em Alegre apesar de acharem que Soares é quem tem hipóteses de obter um melhor resultado contra Cavaco Silva, o que mostra que a argumentação "estratégica" - o voto em Soares como única maneira de derrotar Cavaco - não deverá ser suficiente para os converter.»
(P. Magalhães, in Margens de Erro)
Resta saber, caro Pedro, o que seria preciso fazer para "converter" os eleitores a que se refere. Não sejamos ingénuos! Há muita criatividade a borbulhar nesses lugares geométricos do poder... Ou a "visionária" entrevista, dada hoje à estampa, será mero acaso? Talvez alguém esteja também a querer colocar-se "do lado certo da História"... Mas creio que já vai atrasado!

[63] Pensamento do dia

"Pensa como pensam os sábios, mas fala como falam os homens simples".
(Aristóteles, séc. III a.C.)
Mais importante do que ser Presidente da República ou Pai da Pátria é ser um Homem simples...

[62] Uma questão de confiança

« (...) como secretário-geral do Partido Socialista, Sócrates diz que Soares foi sempre o seu candidato à presidência. Parece que não foi. Manuel Alegre diz que não foi e que Sócrates falou com ele primeiro. As pessoas podem julgar, à primeira vista, que isso não tem importância e que se trata apenas de uma birra no meio de um partido onde já se falou, sucessivamente, de Guterres, de Vitorino e de Jaime Gama. Acontece que tem importância e que não é apenas uma birra de adolescentes para eleger o chefe de turma. Não pelo apoio do PS a Soares que, como se sabe, é parcial e conflituoso, embora oficial. Mas pela palavra dada por José Sócrates e pela forma como vai ser vigiado a partir de agora pelos portugueses que querem saber "como é que convive com esse desmentido", feito por Manuel Alegre».
(F. J. Viegas, in JN, 24-11-2005)
Na linha do que dissemos [61.1]. E Mário Soares tem tudo a ver com isto, por mais que diga que não. Ou alguém acredita que ele não sabe que Alegre foi estimulado/convidado a candidatar-se?

23 novembro 2005

[61] Duas faces bem bochechudas

Afinal, o sábio não tem opinião (ou não quer exprimi-la) sobre duas questões tão essenciais como estas:
1. Quem fala verdade? Sócrates ou Alegre? Dadas as versões completamente contraditórias, não podem ambos falar verdade. E, mentindo um, o pai da Pátria fica manchado também.
2. Convoca ou não convoca um hipotético referendo à regionalização (independentemente da sua opinião pessoal)?
Pois, quando convém usa-se a estratégia que se censura nos adversários... Claro que, sendo usada pelo Senador, ela já é razoável e inteligente, sancionada pela mais fina comunicação social.
Não há paciência para tanta incontinência!

[60] Arrogância cultural anacrónica

«VPV acaba por reconhecer que Soares vem a estas eleições representar um "mundo que nós perdemos", para utilizar o título de um historiador inglês. E curva-se respeitosamente perante esse exercício ("é bom que ele exista"). Nada disto, por muito comovente que seja, explica politicamente a "necessidade" da sua candidatura. Reduzi-lo a uma função ornamental democrática, a crer na prosa destes dois ilustres cronistas, é pouco para Soares. É por isso que ele vagueia, nesta campanha, à sombra do "plebeu" que, mesmo com um sorriso "come merda" (Mesquita dixit), é o verdadeiro aristocrata destas eleições».
# posted by João Gonçalves : 20.11.05
Com a devida vénia, não posso deixar de reproduzir um excerto particularmente brilhante deste blogueur que se vai afirmando consistentemente (e que tenho o prazer de conhecer pessoalmente, se bem que seja aqui irrelevante).
Contra toda a elite de salões empoeirados e de manuais de estilo boboneanos (arregimentando escribas frustrados e intelectuais complexados), o filho do gasolineiro (a quem presto a minha homenagem profunda, com o respeito e orgulho que tenho pelas minhas próprias origens) vai impor-se! E todo o preconceito será castigado...

[59] Arrogância social revisitada

"Mas há, infelizmente, uma perversão social que divide o país em duas raças. Os que têm a dignidade da sua condição e os que se envergonham dela."
(Miguel Torga)

Há, hoje, Mestre, uma terceira raça: os soberbos para com aqueles que não têm (supostamente) a sua condição... Ignoram que a dignidade humana reside no carácter, não na carteira!

[58] De noite, para todos os dias...

"Il più bello dei Mari è quello che non navigammo.
"Il più bello dei nostri figli non è ancora cresciuto.
"I più belli dei nostri giorni non li abbiamo ancora vissuti.
"E quello che vorrei dirti di più bello non te l'ho ancora detto..."
(Nazim Hikmet, 1942)
Pelo Sonho é que vamos... Olhemos em frente e para cima, sem medo. O medo corrói a alma! Apostar sempre no mesmo cavalo é cómodo e prudente, mas a História faz-se de audácia e visão. Às vezes, de contradição... Ou não?

[57] Poesia, ao cair da noite...

"Sempre a imagem das coisas que nos pesa...
As mesmas tintas da Alegria,
O mesmo claro-escuro da Tristeza...
Sempre no mesmo corpo a mesma doença: a vida!
Sempre a mesma elegia em sílabas de mágoa...
Sempre o mesmo perfil de serra empedernida,
Onde o inverno, a chorar, desenha espectros de água".
(Canção da Monotonia, Teixeira de Pascoaes)
Vamos sair desta modorna, abanar consciências e ousar avançar?

[56] Citações do mundo (2): mais, em tempo de campanha

"Talking and eloquence are not the same: to speak and to speak well are two things. A fool may talk, but a wise man speaks." (Ben Johnson)
*
Em campanha eleitoral (e não só), fala-se tanto e diz-se tão pouco... Depois admiram-se de o silêncio ser a melhor estratégia!

[55] Citações do mundo (1): efeitos secundários do poder

“O poder torna as pessoas estúpidas e muito poder torna-as estupidíssimas.”
(R. Kurz)
Vamos perceber isto duma vez? Não basta o que basta?

21 novembro 2005

[54] Política à portuguesa...

Já calculava que, dado o quadro pré-eleitoral, a campanha iria ser dura e áspera. Basta recordar o cenário que o bas-fond político criou ("todos contra um").
Mas, de facto, ainda sou muito ingénuo...
O que já se viu e ouviu mostra que nada se aprendeu com a campanha eleitoral das legislativas de Fevereiro passado. E tende a piorar!

[53] Aplaudo de pé!

Com a licença do autor, reproduzo aqui este post, que subscrevo inteiramente (Paulo Gorjão, in www.bloguitica.blogspot.com).

ARROGÂNCIA CULTURAL
[1396] -- «[C]onvém ter na Chefia do Estado alguém que conheça a História e a cultura do nosso país, alguém que conheça Os Lusíadas, o nosso poema máximo», referiu
Mário Soares (DN, 21.11.2005).
1. Leu o artigo de
Vítor Bento?
2. Alguém consegue explicar qual é a razão objectiva que impõe a obrigatoriedade de ter alguém na Presidência da República que conheça Os Lusíadas? A Ilíada?
3. Cavaco Silva come bolo rei com a boca aberta. Cavaco Silva não leu as obras clássicas. Já todos percebemos que, tal como a maioria dos portugueses, Cavaco Silva não nasceu num berço de ouro. É a vida.E não tendo nascido num berço de ouro -- i.e. não sendo descendente da casta aristocrática preparada para nos governar -- como é que ele ousa usurpar o trono ao seu legítimo herdeiro?Em suma, como é que um reles provinciano de Boliqueime, que subiu na vida à custa do seu próprio esforço (imagine-se, tamanha ousadia...!), admite candidatar-se à Presidência da República?
4. Esta arrogância cultural é um assunto que me toca pessoalmente. Tal como no caso de Cavaco Silva, os meus pais também são pessoas modestas. Na minha infância não aprendi a tocar piano, nem fui estimulado a ler os clássicos. Inevitavelmente, ou talvez não, fui um aluno mediano no secundário. Sem ter alcançado as médias de acesso ao ensino superior público, ingressei no ensino superior privado, por pressão dos meus pais. Foi apenas nessa altura que adquiri o gosto pelo estudo e que me esforcei por ser acima da média em alguma coisa.Passei muitas noites a estudar e li centenas de livros técnicos (e não os clássicos...). Paralelamente, fiz muitas directas para ajudar os meus pais na sua actividade profissional.Por outras palavras, aquilo que alcancei até hoje não o devo ao meu apelido sonante, ou às minhas origens sociais privilegiadas. Ocasionalmente, sou capaz de começar a falar quando ainda tenho comida na boca e, eventualmente, sou capaz de colocar os cotovelos em cima da mesa. Horror dos horrores, sou capaz de fazer coisas ainda piores. Nunca li Os Lusíadas de uma ponta à outra. Tenho conhecimentos muito rudimentares sobre música clássica e não percebo absolutamente nada de poesia.Tudo isto significa que não posso ascender socialmente em Portugal? Que não vou ser tolerado pela elite aristocrática e que nunca poderei vir a ser Primeiro-Ministro ou Presidente da República?Não acha que há aqui qualquer coisa profundamente errada?
5. Leu o artigo de
Vítor Bento?
# posted by PG : 01:01

Arquivo do blogue

Seguidores