Terapia política. Introspecção psicossocial. Análise simbólica.

31 outubro 2006

[384] O espírito da "modernidade"

"Já estou a ver que a senhora [Ségolène Royal, candidata às eleições presidenciais de 2007, em França] é da esquerda soft, como diz o Blair, ou moderna, como lhe chama o Sócrates. Quer dizer: a direita."
(leitor/blogger "reviralho", em comentário aqui: destaque nosso)

30 outubro 2006

[383] "Estado, funcionários públicos e os outros"

Pode um governo desenvolver um conjunto de acções tendentes a criar na opinião pública uma imagem extremamente negativa dos funcionários públicos?
Pode, por razões estratégicas, mas não deveria. Por dois motivos: primeiro, a maioria dos aspectos negativos deve ser imputada à própria entidade patronal (Estado); segundo, a "mensagem" é injusta por revelar apenas um dos lados da apreciação.
Consideremos apenas alguns dos aspectos consolidados na opinião pública: existe um excesso de funcionários (alguns, em serviços desnecessários), são pouco produtivos ou mesmo ineficientes, ganham demasiado, têm tido emprego garantido e um sistema de protecção social muito generoso.
Os três primeiros aspectos, para além de não poderem ser generalizados a uma "massa" indiscriminada de trabalhadores, ocultam o papel activo de sucessivos governos na contratação indiscriminada, na indefinição de funções e objectivos, na ausência de uma avaliação de desempenho séria, na falta de coragem em dizer "não" em alguns processos negociais, na nomeação de altos dirigentes que até desconhecem os recursos humanos que têm de gerir. O quarto aspecto, verdadeiro, tem raízes históricas: as ditaduras sempre protegeram os servidores do Estado (designação ainda existente na entidade responsável pela protecção na doença, a ADSE).
Deverá o Governo extinguir organismos, avaliar as necessidades em recursos humanos, implementar uma avaliação de desempenho rigorosa, eliminar os subsídios indevidos e as remunerações extraordinárias que não correspondam a trabalho extraordinário? Claro que sim. Agiu bem o Governo ao harmonizar os sistemas de pensões? Claro que sim.
Então, o que é que o Governo se esquece de transmitir para a opinião pública? Três questões essenciais.
Em primeiro lugar, os funcionários públicos constituem uma fonte certa de receita fiscal já que não existem declarações abaixo das remunerações efectivas ou outras formas de evasão em sede de IRS.
Em segundo lugar, os funcionários públicos pagam taxas específicas para o sistema de pensões (tal como no sector privado) e para a protecção na doença, com retenção na fonte e sobre remunerações efectivas.
Em terceiro lugar, a necessidade de aumentar a comparticipação para a ADSE é fortemente explicada pelo congelamento salarial dos últimos anos, logo pela redução da receita desta entidade. Como esta explicação não era "politicamente correcta", o Governo preferiu passar a mensagem que as despesas de saúde dos funcionários públicos não devem ser pagas pelos outros. Pois é, também muitos dos funcionários públicos não gostam de pagar impostos para os outros, sejam eles quem forem!
(Manuela Arcanjo, Professora no ISEG, in Diário de Notícias, 16-10-2006)

27 outubro 2006

[382] As palavras dos outros (6): carta aberta ao Sr. Eng.º Sócrates

Esta é a terceira carta que lhe dirijo.
As duas primeiras motivadas por um convite que formulou, mas não honrou, ficaram descortesmente sem resposta. A forma escolhida para a presente é obviamente retórica e assenta NUM DIREITO QUE O SENHOR AINDA NÃO ELIMINOU: o de manifestar publicamente indignação perante a mentira e as opções injustas e erradas da governação.
Por acção e omissão, o Senhor deu uma boa achega à ideia, que ultimamente ganhou forma na sociedade portuguesa, segundo a qual os funcionários públicos seriam os responsáveis primeiros pelo descalabro das contas do Estado e pelos malefícios da nossa economia. Sendo a administração pública a própria imagem do Estado junto do cidadão comum, é quase masoquista o seu comportamento.
Desminta, se puder, o que passo a afirmar:
1.º Do Statistics in Focus n.º 41/2004, produzido pelo departamento oficial de estatísticas da União Europeia, retira-se que a despesa portuguesa com os salários e benefícios sociais dos funcionários públicos é inferior à mesma despesa média dos restantes países da Zona Euro.
2.º Outra publicação da Comissão Europeia, L'Emploi en Europe 2003, permite comparar a percentagem dos empregados do Estado em relação à totalidade dos empregados de cada país da Europa dos 12. E o que vemos? Que, em média nessa Europa, 25,6 por cento dos empregados são empregados do Estado, enquanto em Portugal essa percentagem é de apenas 18 por cento. Ou seja, a mais baixa dos 12 países, com excepção da Espanha. As ricas Dinamarca e Suécia têm quase o dobro, respectivamente 32 e 32,6 por cento. Se fosse directa a relação entre o peso da administração pública e o défice, como estaria o défice destes dois países?
3º. Um dos slogans mais usados é do peso das despesas da saúde. A insuspeita OCDE diz que na Europa dos 15 o gasto médio por habitante é de 1458. Em Portugal esse gasto é 758. Todos os restantes países, com excepção da Grécia, gastam mais que nós. A França 2730, a Austria 2139, a Irlanda 1688, a Finlândia 1539, a Dinamarca 1799, etc.
Com o anterior não pretendo dizer que a administração pública é um poço de virtudes. Não é. Presta serviços que não justificam o dinheiro que consome. Particularmente na saúde, na educação e na justiça. É um santuário de burocracia, de ineficiência e de ineficácia. Mas infelizmente os mesmos paradigmas são transferíveis para o sector privado. Donde a questão não reside no maniqueísmo em que o Senhor e o seu ministro das Finanças caíram, l
ançando um perigoso anátema sobre o funcionalismo público. A questão reside em corrigir o que está mal, seja público, seja privado. A questão reside em fazer escolhas acertadas.
O Senhor optou pelas piores. De entre muitas razões que o espaço não permite, deixe-me que lhe aponte duas:
1.º Sobre o sistema de reformas dos funcionários públicos têm-se dito barbaridades. Como é sabido, a taxa social sobre os salários cifra-se em 34,75 por cento (11 por cento pagos pelo trabalhador, 23,75 por cento pagos pelo patrão). OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS PAGAM OS SEUS 11 POR CENTO! Mas O SEU PATRÃO ESTADO NÃO ENTREGA MENSALMENTE À CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, COMO LHE COMPETIA E EXIGE AOS DEMAIS EMPREGADORES, os seus 23,75 por cento. E é assim que as "transferências" orçamentais assumem perante a opinião pública não esclarecida o odioso de serem formas de sugar os dinheiros públicos.
Por outro lado, todos os funcionários públicos que entraram ao serviço em Setembro de 1993 já verão a sua reforma ser calculada segundo os critérios aplicados aos restantes portugueses. Estamos a falar de quase metade dos activos. E o sistema estabilizará nessa base em pouco mais de uma década.
Mas o seu pior erro, Senhor Engenheiro, foi ter escolhido para artífice das iniquidades que subjazem à sua política o ministro Campos e Cunha, que não teve pruridos políticos, morais ou éticos por acumular aos seus 7.000 Euros de salário, os 8.000 de uma reforma conseguida aos 49 anos de idade e com 6 anos de serviço. E com a agravante de a obscena decisão legal que a suporta ter origem numa proposta de um colégio de que o próprio fazia parte.
2.º Quando escolheu aumentar os impostos, viu o défice e ignorou a economia. Foi ao arrepio do que se passa na Europa. A Finlândia dos seus encantos baixou-os em 4 pontos percentuais, a Suécia em 3,3 e a Alemanha em 3,2.
3.º Por outro lado, fala em austeridade de cátedra e é apologista, juntamente com o presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo, da implosão de uma torre (Prédio Coutinho) onde vivem mais de 300 pessoas. Quanto vão custar essas indemnizações, mais a indemnização milionária que pede o arquitecto que a construiu, além do derrube em si?
4.º Por que não defende V. Ex.ª a mesma implosão de uma outra torre, na Covilhã (ver 'Correio da Manhã' de 17/10/2005), em tempos defendida pela Câmara, e que agora já não vai abaixo? Será porque o autor do projecto é o Arquitecto Fernando Pinto de Sousa, por acaso pai do Senhor Engenheiro, Primeiro Ministro deste país?
Por que não optou por cobrar os 3,2 mil milhões de Euros que as empresas privadas devem à Segurança Social?
Por que não pôs em prática um plano para fazer a execução das dívidas fiscais pendentes nos tribunais tributários e que somam 20 mil milhões de Euros?
Por que não actuou do lado dos benefícios fiscais que em 2004 significaram 1.000 milhões de Euros?
Por que não modificou o quadro legal que permite aos bancos, que duplicaram lucros em época recessiva, pagar apenas 13 por cento de impostos?
Por que não renovou a famigerada Reserva Fiscal de Investimento que permitiu à PT não pagar impostos pelos prejuízos que teve no Brasil, o que, por junto, representará cerca de 6.500 milhões de Euros de receita perdida?
A Verdade e a Coragem foram atributos que Vossa Excelência invocou para se diferenciar dos seus opositores.
QUANDO SUBIU OS IMPOSTOS, QUE PERANTE MILHÕES DE PORTUGUESES GARANTIU QUE NÃO SUBIRIA, FICÁMOS TODOS ESCLARECIDOS SOBRE A SUA VERDADE. QUANDO ELEGEU OS DESEMPREGADOS, OS REFORMADOS E OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS COMO PRINCIPAIS INSTRUMENTOS DE COMBATE AO DÉFICE, PERCEBEMOS DE QUE TEOR É A SUA CORAGEM.

(Santana Castilho, Professor do Ensino Superior, Coordenador na Escola Superior de Educação de Santarém: cortesia do leitor "pedro", por correio electrónico. Destaques, a negrito, nossos)

26 outubro 2006

[381] A vida é bela! (6)

"(...) Antigamente, rapazes e raparigas entendiam-se como se entendem hoje. Não tinham era o à vontade que há hoje. Você não faz ideia do pavor que era namorar! Vocês hoje não têm a mínima noção disso. Vocês vivem no paraíso! Mas a grande revolução foi a pílula. Não estou a falar por mim que eu nunca tomei essa porcaria. Detesto isso.
Eu sou contra o aborto. Eu não acho bem que se prendam as pessoas, mas sou contra o aborto. Eu sou a favor da Natureza. A Natureza não é a favor do aborto.
Há pessoas que não podem criar os filhos? Isso é conversa! Sim, tudo se cria. Tem em mim o exemplo. Eu, sem dinheiro nenhum, sem emprego nenhum, tenho 8 filhos. Isso é conversa, isso é uma cobardia que esses gajos instigam. Não, não misture as coisas. O referendo não é a favor do aborto. Eu desisti um bocadinho da política porque fui lá de propósito para votar a favor da despenalização do aborto e foi o que se viu. Com certeza que sou a favor da despenalização. Andarem aí a prender as raparigas, isso é um disparate.
O Estado é que não quer dar o apoio à mãe solteira. Haviam de ter apoio, tudo de borla, para elas e para os filhos. Filhos indesejados? Vamos lá a ver: uma rapariga que vai para a cama com um rapaz sabe que se arrisca. (...)"
(Luís Pacheco, Público, 28-3-2004: cortesia do leitor "Reprobo")

[380] As palavras dos outros (5): credibilizar, não domesticar!

«As razões teórico-jurídicas que legitimaram as opções que os pais fundadores [da actual República] assumiram ainda permanecem válidas nos dias de hoje.
Mau grado isso, tem-se assistido a uma deslegitimação larvar e surda dos tribunais a que não escapa mesmo este Supremo, cúpula geral do sistema; processo filtrado, com frequência, em notícias vindas a lume na comunicação social e que só podem ser lidas como a mensagem criptada de poderes fácticos.
Desde o acórdão deste Supremo (recurso penal n.º 3250/04) que recusou ao arguido (que assassinara a mulher) a atenuação especial da pena que ele pretendia, por "negligência culinária" ou por saídas a sós dela, condenando-o tabelarmente a 14 anos de prisão, e apareceu na imprensa exactamente ao contrário como se tivesse havido atenuação extraordinária e o Supremo estivesse fora do mundo; até ao acórdão que usou o conceito jurídico de
"bom pai de família", oriundo do direito romano, usado comummente na ordem jurídica europeia e que varre áreas tão diversas como a definição da culpa nos acidentes de viação ou a origem de servidões prediais, e que foi apresentado mediaticamente como reflexo de uma visão quase neo-fascista da sociedade - tudo serviu para descredibilizar, deslegitimando, provavelmente para que a seguir se "legitime", credibilizando, uma nova estrutura constitucional diferente daquela que os pais fundadores nos legaram

[379] A crise em Portugal, vista pelos deputados

Na edição do "Diário de Notícias" de 20 de Outubro de 2006 vem, na página 4, uma pequena, mas muito interessante, notícia.
Reza a mesma que a Assembleia da República aprovou no dia anterior, em plenário, o seu próprio Orçamento para 2007, do qual faz parte uma verba total para "obras de remodelação das bancadas e do sistema de ar condicionado" de mais de 3 milhões de euros (cerca de 600.000 contos na moeda antiga).
Se aqui começamos a ficar no mínimo indignados, o pior está, no entanto, para vir: para adaptação do sistema de votação electrónica dos deputados (sistema esse que existe há muito pouco tempo), o Estado prepara-se para gastar, pasme-se, um milhão e cem mil euros!
(adaptado da notícia reportada pelo leitor "pedro", por correio electrónico)

25 outubro 2006

[378] A crise em Portugal, vista por Espanha

«A crise em Portugal foi tema de um documentário de 45 minutos transmitido ontem à noite no programa "En Portada", um dos principais espaços de grande reportagem do canal 2 da televisão espanhola, TVE. A descrição foi a de um país que "é o mais desigual da Europa, onde 20 por cento da população roça a pobreza" e no qual a população vive "com a auto-estima mais baixa da UE a 25", num clima de "depressão e desânimo".
Percorrendo Portugal de Norte a Sul e registando declarações de membros do Governo, especialistas, académicos, autarcas e cidadãos anónimos, o programa abordou alguns dos aspectos mais preocupantes da realidade social e económica portuguesa.
Temas como a desertificação, o isolamento do interior, o fecho de serviços de saúde e escolas devido ao despovoamento de várias regiões, a burocracia, os atrasos nas obras e as perdas de empregos na indústria marcaram a viagem da equipa de reportagem espanhola.
O documentário visitou, entre outras, povoações como Escalhão, próximo do Vale do Côa, onde um pastor dizia que "até as pedras levam", numa referência à venda de granito para Espanha.
A aldeia de Rabal, Bragança, a cidade de Mirandela, em Trás-os-Montes, as lotas de Peniche e de Lagos foram algumas das regiões percorridas. Ao longo dos 45 minutos, o documentário descreveu a situação que vivem povoações isoladas "onde o ciclo vicioso" do despovoamento levou os habitantes a sentirem-se isolados e esquecidos pelos centros de poder.
"A economia expandiu-se, com a adesão à Europa, mas não se modernizou", referia o documentário, notando, por exemplo, a falta de modernização de algumas fábricas têxteis ou as dificuldades da frota de pesca portuguesa que traz para terra apenas 25 por cento do que o país consome.
O documentário incluiu referências aos 60 milhões de euros acima do previsto que custaram os estádios do Euro 2004, aos atrasos na extensão do Metro e no Túnel do Marquês.
Difícil situação económica:
Com declarações de Victor Constâncio, sobre o défice das contas públicas, do ministro da Economia Manuel Pinho, sobre os objectivos do Governo de "ajustar as contas públicas e estimular empresas privadas", o documentário procurou apresentar um retrato da situação económica em Portugal.
Referiu, por exemplo, que "no meio da crise, o sector da banca registou um aumento de 30 por cento nos lucros" e que, "numa contradição evidente", Portugal tem "um dos espaços comerciais maiores da Europa". "Apesar de tudo, o consumo teima em não baixar", comentou o autor da reportagem.
Aludindo à governação de José Sócrates, o documentário referiu que o primeiro- ministro "não tem contestação no Governo", que as críticas da oposição "são débeis" e que, ao fim do mandato, "o sucesso ou o falhanço da agenda de governação dependerá exclusivamente do chefe do Governo".
Apesar da crise, o documentário dá conta dos esforços em várias áreas para ultrapassar a situação, modernizar a indústria, requalificar zonas turísticas no Algarve e reforçar o investimento em investigação e tecnologia.
Como exemplo, cita o sucesso de algumas fábricas de têxtil e calçado, o modelo adoptado na AutoEuropa e os avanços no sector da cortiça, visitando ainda o centro de formação de Famalicão.
Igualmente a merecer atenção a tentativa de várias zonas mais isoladas do interior português de apostarem em acções conjuntas transfronteiriças com vizinhas espanholas, no intuito de criar "euro-regiões" que possam beneficiar de mais apoios europeus.
"É um país sereno, educado, por vezes lento, que luta à sua maneira para sair da crise. Das várias crises", conclui o documentário.»
(21.10.2006 - 13h58, Lusa)

[377] Livre, ma non troppo...

«Não sendo subscritor, genericamente, das teses dos chamados "neo-con", não vejo qual o problema de haver imprensa dessa área... ou a liberdade de imprensa só existe se todos forem "neo-labour"?
Aliás, prefiro que todas essas correntes estejam claramente identificadas na imprensa e na política (através de declarações de interesses), de modo a que as escolhas se façam em consciência.
Pior é ter "neo-cons" travestidos de socialistas...»
(Núncio, em comentário deixado aqui, na sequência da reflexão feita no post "[370] Lendo os outros: auto-censura?", de 23-10-2006)

24 outubro 2006

[376] Serviço público: mapa de viagens

[375] A vida é bela! (5)

"Quando tiramos a vida aos homens, não sabemos nem o que lhes tiramos, nem o que lhes damos".
(Lord G. G. Byron, poeta inglês, 1788-1824)

[374] A vida é bela! (4)

"(...) sagro estes ossos que, póstumos,
recusam-se à própria sorte,
como a dizer-me nos olhos:
a vida é maior que a morte."
(Ivan Junqueira, poeta brasileiro, A Sagração dos Ossos, para Bruno Tolentino)

[373] A vida é bela! (3)

[372] A vida é bela! (2)

[371] A vida é bela!

«E receio bem a herança que vamos deixando aos nossos descendentes: um mundo em regressão civilizacional que vai cedendo paulatinamente ao relativismo individualista e ao novel moralismo hedonista.»
(João Távora, "Por causa do Não", Blogue do Não - Portugueses Livres, 23-10-2006)

23 outubro 2006

[370] Lendo os outros: auto-censura?

«(...) há uma razão muito simples, que ninguém quer admitir, e que tem a ver com a permanência nos valores mentais, nos hábitos da nossa democracia, dos quadros do Portugal de Salazar. Valores como o "respeitinho", a hipocrisia pública, a retórica antipolítica, a tentação de considerar que o suprapartidário é bom, a obsessão pelo "consenso", o medo da controvérsia, a cunha e a clientela, mesmo a corrupção pequena, a falta de espírito crítico desde as artes e letras até à imprensa e Igreja, tudo vem do quadro do salazarismo e reprodu-lo. O medo do conflito, essa tenebrosa herança de 48 anos de censura, permanece embrenhado na vida política da democracia e isso dá vida à nostalgia da pasmaceira vigiada de Salazar.
(...) O que me interessa é recensear que atitudes, nostalgias, hábitos, costumes, práticas, que ninguém associa a Salazar, mas vêm directamente dele e do Estado Novo, continuam vivos, adoecendo a nossa democracia. Isso sim, é importante.»
(J. Pacheco Pereira, Abrupto, "Porque razão a Democracia tem medo de Salazar, versão 2.0": o destaque é nosso)
*
Dificilmente haverá melhor exemplo desta vigilância provinciana e castradora do que aquela a que a "imprensa livre e democrática" se auto-submete, todos os dias, em todos os meios.
A liberdade e a democracia têm, quanto à imprensa nacional, um sentido meramente formal, senão mesmo caricatural.
Quase toda ela é administrada pela Sonae, pela Lusomundo e pelos grupos económico-financeiros afins (os quais, pela natureza das coisas, não podem ter uma visão desinteressada e distante dos factos e das notícias, como ainda recentemente se tornou embaraçosamente evidente a propósito das férias judiciais, da restruturação da Administração Pública e da greve dos professores).
A que não é detida por tais empresas privadas, é indirectamente controlada pela maior empresa privada do país, com sede ali na Gomes Teixeira (e isso o anteprojecto de proposta de lei sobre limites à concentração da titularidade nas empresas de comunicação social, em discussão pública até ao fim do mês, não vai resolver, nem pretende...)
Por outro lado, a maior parte dos editoriais (escritos por e para minorias influentes) e artigos de opinião (de forte pendor encomiástico) tem, sob a capa da isenção e objectividade, uma indisfarçável adesão a preconceitos político-partidários (contem-se os deputados, ex-ministros, autarcas e "agentes" culturais, entre outros, que engrossam as listas de comentadores e analistas, até de futebol!), o que seria aceitável se houvesse uma inequívoca declaração prévia de interesses... Onde está ela? Viram-na?
(continua oportunamente)

[369] Civilização ou destruição?

"(...) acho que a defesa da vida, ainda que em forma potencial, é um valor civilizacional do mais avançado que existe, até porque se prende com o alargamento do conteúdo de um direito fundamental que é basilar para todas as civilizações: o direito à vida."
(comentário anónimo, às 1:59, a este post do João Gonçalves, no Portugal dos Pequeninos)

17 outubro 2006

[368] Inconfidências e incoerências

Todos têm direito à privacidade e intimidade (que não se confundem). Ninguém deve ser prejudicado (nem beneficiado), pessoal ou profissionalmente, por factos dessas duas esferas (desde que, obviamente, sejam lícitos ou legítimos). Incluindo namoradas de políticos.
Dito isto, que reconheço banal, direi o seguinte.
Quando se aceita o pedido de namoro de uma tal personalidade, deve ter-se consciência plena das consequências de tal relação. Sobretudo se se for jornalista/analista/comentadora. Em primeiro lugar (e longe de tentar escrever a "Bíblia" do jornalismo), nunca por nunca usar como fonte privilegiada/anónima o PM. Nenhum facto que chegou ao seu conhecimento por intermédio do PM deve ser revelado, comentado, trocado. Justamente por se tratar de uma relação do foro privado, o PM não pode ser fonte informativa nem musa inspiradora.
O que nos leva a um segundo cuidado especialíssimo: é de evitar a todo o custo comentar/analisar factos directamente relacionados com o desempenho do PM (ou do namorado politico). Se fossem censuras, soariam a falso (quiçá, injustamente); se fossem encómios, seriam completamente despropositados numa namorada.
Daqui à terceira reflexão vai um pequeníssimo salto: é que, tendo sido jornalista (brilhante ou opaca, pouco importa), não é pelo facto da relação ser do foro privado que ela se torna irrelevante para a carreira profissional. Pelo contrário, ser namorada do PM é muítissimo relevante, pelas razões já aduzidas e por uma mais e que está bem documentada neste post de JG e também na resposta da visada: a pessoa é una, não há dupla nem tripla personalidade (espera-se) nem se é uma cómoda onde se arrumam por gavetas os sentimentos, os valores, as convicções, os desejos, as dúvidas e as ideologias. E sendo una, é sempre a jornalista/namorada que está presente e isso requer, por se tratar de um "superestatuto", uma "superexigência".
(Núncio, comentário deixado aqui)

16 outubro 2006

[367] Certo, mas...

*
E não teríamos muito mais receitas com um sistema de tributação mais justo e mais eficiente? Ou já se esqueceram dos modelos sueco e finlandês?

[366] Cuidado!

Nesta época conturbada, é preciso estarmos alerta, como os jovens e esperançosos escoteiros...
Destruição de fronteiras, destruição do meio ambiente, destruição de valores, destruição da memória.
São tempos pré-totalitários, de que a doutrina do politicamente correcto é o seu principal mensageiro...

[365] Já há 27 anos...

"Magistratura que, caluniada e mal remunerada, assoberbada de trabalho e de recomendações de pressa e urgência e informações estatísticas, consciente ao mesmo tempo, por um lado, da sua posição na sociedade e das exigências dessa posição e, por outro, da falta clamorosa de meios de toda a ordem, continua heroicamente a desempenhar o seu mister, e não é, nem de longe, a maior culpada da progressiva degradação dos serviços judiciários." (1)
(1) Prof. J. Castro Mendes, em "Estudos Sobre a Constituição", coord. de Jorge Miranda, Lisboa, 1979, vol. III, pág. 659.
(cortesia de "pedro", via electrónica)

[364] Não há mais ninguém para lhes bater?

"(...) a que níveis gostaria que os funcionários públicos (FP) portugueses as melhorassem [a produtividade e qualidade do seu trabalho]? Aos níveis médios de produtividade e qualidade do sector privado (SP) nacional, por sinal dos mais baixos da União Europeia?
Porque hão-de dar os FP (cerca de 700 mil) aquilo que não dá o SP (cerca de 5 milhões)? Sempre julguei que a riqueza de um país fosse o resultado da produção das suas empresas, das suas indústrias, da sua agricultura, dos seus comerciantes, dos seus serviços e da receita cobrada a TODOS os trabalhadores..."
(Núncio, em comentário deixado a um leitor daqui)

[363] Pode repetir?

(Ana Catarina Mendes, vice-presidente do grupo parlamentar socialista)
*
Permito-me sugerir, com base no critério fixado por esta alta responsável parlamentar, os próximos temas referendários:
- "o que se pretende não é fazer um apelo ao contrabando, mas sim, sabendo que ele existe, promover a sua realização em condições dignas";
- "o que se pretende não é fazer um apelo à imigração, mas sim, sabendo que a imigração ilegal existe, promover a sua realização em condições dignas";
- "o que se pretende não é fazer um apelo ao doping, mas sim, sabendo que a dopagem ilegal existe, promover a sua realização em condições dignas";
- "o que se pretende não é fazer um apelo à estética da magreza, mas sim, sabendo que a anorexia existe, promover a sua realização em condições dignas";
- "o que se pretende não é fazer um apelo ao tráfico de órgãos, mas sim, sabendo que o seu comércio ilegal existe, promover a sua realização em condições dignas".

[362] Antes que seja tarde demais...

A propósito disto e disto:
"Embora de forma áspera e cruel, JAS (de cuja escrita e "doutrina" não sou particular adepto) diz o essencial sobre os nossos tempos, na Europa e em Portugal: (quase) toda a legislação, regulamentação e promoção é negativa, destruidora, asfixiante!
Não se vive em serenidade, mas em stress; não se apela à compaixão, mas à competitividade; não se procura o bem, mas o mal menor; não se educa, "instrói-se"; não se combate a pobreza nem a solidão, antes se desertifica e exclui-se; não se cria riqueza, [consome-se]; não se poupa, gasta-se; não se valoriza a vida, facilita-se a morte..."
(Núncio, em comentário deixado aqui)

11 outubro 2006

[361] Palavras antes do tempo

"O projecto MIT-Portugal começou por ser um grande projecto. Recentemente passou a ser um projecto pequeno e de reduzido impacto. Infelizmente, mais do que nunca, Portugal precisa de grandes projectos, projectos ambiciosos. Projectos capazes de envolver os cidadãos e os diversos sectores da sociedade. Um fenómeno sintomático de um país em vias de crise em quando se fala sobretudo sobre o que o país foi no passado. Nao quero dizer com isto que se perca a nossa identidade. De forma alguma. Contudo, quando as memórias excedem os sonhos, é porque a sociedade não acredita em si, não acredita no futuro. Se excluírmos a passagem da ditadura à democracia, Portugal já nao arrisca há cerca de 500 anos. No caso do MIT-Portugal voltou a não fazê-lo, apesar de ter como parceiro a melhor escola do mundo de engenharia e de tecnologia.

Que Portugal e os portugueses têm inegável potencial e valor, não restam dúvidas. No entanto, queremos continuar a sustentar esta postura autoritária, paternalista, obsoleta, vigente no programa MIT-Portugal, ou queremos seguir em frente e ser o que potencialmente podemos ser? O futuro o dirá. Mas uma coisa é certa: se não formos nós portugueses a fazê-lo, ninguém o fará
."

07 outubro 2006

[360] Me engana que eu gosto...

(Luís M. Jorge, O franco-atirador, 4-10-2006: destaque nosso)
*
"Nossos" impostos? De quem? Dos construtores civis? Dos advogados? Dos futebolistas? Dos empresários? Dos banqueiros? Dos jornalistas "free-lancers"? Dos arquitectos?
Não. Ironicamente, dos funcionários públicos... Ou seja, a percentagem dos impostos que se destina a pagar os salários daqueles que contribuem esmagadoramente para esses impostos não é mais pequena porque muitos não-funcionários públicos não pagam aquilo que deveriam pagar e que faria com que o bolo fosse bem maior e, assim, já os salários dos infelizes funcionários públicos poderiam apenas corresponder a 40% dos impostos!
É a evasão fiscal, stupid!

[359] As palavras que te direi...

"Lula é um pouco um caudilho, com alguns traços mais do peronismo do que do chavismo." Para o ex-presidente, é justamente por ter esse perfil que o petista "não tem herdeiros" [políticos]. "Um caudilho acredita sempre que é único."
Falou também de Lula como um "símbolo", (...). "Lula é uma pessoa excepcional, que veio do nada. Mas é uma pena, porque está eliminando o simbolismo de sua figura. Lula nunca foi líder, mas sim um símbolo. É importante que um país tenha símbolos e inclusive mitos. Mas agora o Lula presidente está matando o Lula símbolo".
(Fernando Henrique Cardoso sobre Luís Inácio "Lula" da Silva, aqui)

Arquivo do blogue

Seguidores