Terapia política. Introspecção psicossocial. Análise simbólica.

03 março 2006

[176] A pós-modernidade na linguagem

Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar "afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via gramatical, isto tem sido um fartote pegado!
As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber a menção de "auxiliares domésticas". De igual modo, extinguiram-se nas escolas os "contínuos"; passaram todos a "auxiliares de acção educativa". Do mesmo modo, e para felicidade dos "encarregados de educação", aboliu-se o aluno cábula; tais estudantes serão, quando muito, "crianças com necessidades pedagógicas". O analfabetismo desapareceu, cedendo o lugar à "iliteracia". Os gangues étnicos são "grupos de jovens". Os vendedores de medicamentos tratam-se por "delegados de propaganda médica" e os caixeiros-viajantes por "técnicos de vendas". As fábricas, essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas de fora são "centros de decisão nacionais". Desapareceram dos combóios as classes 1.ª e 2.ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas, mas continuam a cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".
A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da melodia para: «Tenho uma família monoparental»... O abortamento eufemizou-se em "interrupção voluntária da gravidez" e já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo".
O "politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais e, para compor o ramalhete, as gentes cultas da praça dão-se a "implementações", "posturas pró-activas", "políticas fracturantes" e outras impropriedades da linguagem.
À margem da revolução semântica ficaram as putas. Essas moças são ainda agora quem melhor cultiva a língua. Da porta do prostíbulo para dentro, não há "politicamente correcto" que lhes dobre a língua!
E assim vagueamos, perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico.
(adaptado por Núncio de um texto anónimo que circula pela internet)

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