Terapia política. Introspecção psicossocial. Análise simbólica.

07 fevereiro 2008

[546] À atenção de Alberto Costa: não se mexe no que funciona

«Férias individuais prejudicam advogado, juiz e cidadão
Mais uma vez, na tentativa resolver problemas complexos com simples canetadas, meteu-se os pés pelas mãos. O fim das férias coletivas no Judiciário brasileiro e a idéia de fazer da Justiça uma atividade ininterrupta não deu certo. É o que sustenta a maioria dos juízes. Três anos depois do fim do descanso coletivo — que só foi respeitado, de fato, em 2007 — há um consenso de que mudou para pior. Já há até uma Proposta de Emenda Constitucional para que as férias voltem a ser a um só tempo.
Logo que as férias coletivas acabaram, a advocacia se deu conta de que, se os prazos processuais continuassem a correr o ano inteiro, os advogados, consequentemente, teriam de trabalhar o ano inteiro — principalmente os pequenos, que trabalham sozinhos.
Em 2005, os tribunais ainda fizeram férias coletivas porque não se sabia se a regra precisava ou não de regulamentação. Decidiu-se, então, que a Emenda Constitucional 45, que determinou o funcionamento ininterrupto dos tribunais e fóruns, era de aplicação imediata. Em 2006, os tribunais lutaram no Supremo Tribunal Federal e no Conselho Nacional de Justiça para garantir o descanso coletivo. Não conseguiram e só em 2007, de fato, todos obedeceram e aboliram as férias coletivas. Aí perceberam como a emenda foi pior que o soneto.
O fim das férias coletivas se mostrou prejudicial tanto para o advogado como para o Judiciário”, considera Fernando Mattos, vice-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). E são vários os motivos para isso.
As férias coletivas valiam paras os tribunais estaduais e federais, onde as decisões são colegiadas. Quando os desembargadores saíam de férias juntos, os julgamentos ficavam paralisados por dois meses — janeiro e julho. Hoje, cada desembargador sai de férias quando programa e, consequentemente, as turmas de julgamento ficam desfalcadas.
Agora, as turmas trabalham durante os 12 meses do ano, mas, quase sempre, com um desembargador a menos. Para tapar o buraco, são convocados juízes. Em alguns tribunais estaduais — São Paulo, Paraná e Santa Catarina — há juízes de prontidão para cobrir férias de desembargadores. São os chamados juízes substitutos de segunda instância. Mas nos outros não há a figura dos substitutos e quem tem de cobrir são os juízes de primeira instância, que deixam suas varas.
Ou seja, de acordo com os relatos, o fim das férias coletivas na segunda instância está refletindo na produção da primeira. Os juízes deixam as suas varas e são substituídos por juízes substitutos. Esses não têm a agilidade do titular, acostumado a lidar com os processos na sua vara. Como toda situação provisória, os titulares cobrem desembargadores dentro do seu limite. Isso prejudica também o andamento dos processos na segunda instância.
Quando o relator sai de férias, os processos dele ficam parados. Se no mês seguinte o revisor sair de férias, mais 30 dias sem julgamento daquele caso”, explica o desembargador José Maurício, do Tribunal de Justiça do Paraná. No estado onde trabalha, desde 1995, existem os chamados juízes substitutos de segunda instância. Lá, pelo menos, os juízes não precisam deixar suas varas para cobrir férias.
Foi uma medida bem intencionada que, na prática, se mostrou prejudicial”, considera Fernando Gonçalves, juiz convocado para a Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. “Os tribunais funcionam de forma colegiada. Proibir que tirem férias juntos não acelera nada. Só prejudica”, avalia.
Vai e vem da jurisprudência
A constante troca de julgadores de segunda instância (a cada desembargador que sai, um juiz é convocado) gera outro problema além da demora no julgamento dos processos. A turma dificilmente vai formar uma jurisprudência, já que cada novo julgador pode trazer seu novo entendimento. Basta pensar isso acontecendo em todos os tribunais no país para concluir quão grande pode ser a insegurança jurídica gerada.
O advogado apresenta um recurso e não sabe quem vai julgá-lo. O juiz de primeira instância também não consegue se orientar pelo entendimento do tribunal, que muda com mais freqüência. “A convocação de juízes impede a formação de uma jurisprudência”, admite Fernando Mattos da Ajufe.
Mattos chama atenção para outro problema, dessa vez, de ordem administrativa e financeira. Toda vez que um juiz é convocado para o tribunal, ele tem de receber salário de desembargador. Além disso, o que ele vai gastar para se transportar até a sede do tribunal — como passagens e diárias — também tem de ser bancado pelo Judiciário. Ou seja, mais custo.
Arrependimento formal
Isso tem que acabar. Vai ser melhor para todos, inclusive para o jurisdicionado, voltar como era antes”, diz José Maurício. O arrependimento que reina no Judiciário e na advocacia já refletiu no Legislativo.
No ano passado, o deputado federal José Santana de Vasconcellos (PR-MG) apresentou a PEC 3, que pretende tornar tudo como era antes. Ele propôs a volta das férias coletivas. “A esta altura, está claro que a eliminação das férias forenses nem beneficiou os advogados, nem contribuiu para a celeridade judicial”, reconhece.
A sua proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, por unanimidade, no dia 5 de setembro. No dia 28 de novembro, foi criada Comissão Especial para analisar o projeto. Vale lembrar que o fim das férias coletivas fez parte da Reforma do Judiciário, que tramitou no Congresso Nacional durante mais de 10 anos, tempo suficiente para análises e estudos do que estava sendo proposto.»
(Aline Pinheiro, Revista Consultor Jurídico, 2 de Fevereiro de 2008: cortesia do leitor Panfúncio)

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