Terapia política. Introspecção psicossocial. Análise simbólica.

30 maio 2009

[876] Notas esparsas sobre uma eleição pouco democrática

Pese embora possuir efectivamente todas essas qualidades (políticas, técnicas e humanas), Jorge Miranda cometeu dois erros: entrou a destempo (foi o 4.º nome proposto pelo PS, depois de Freitas do Amaral, António Arnaut e, se não erro, Laborinho Lúcio) numa luta partidária que, estranhamente, nada tem a ver com toda a sua carreira; e, em segundo lugar, entrou numa corrida onde já estava Maria da Glória Garcia, que foi sua aluna e é hoje vice-Reitora da universidade (Católica) onde também lecciona.
Porquê? Para quê?
*
Quando chamei a atenção para a chegada tardia de Jorge Miranda à compita, onde já estava Maria da Glória Garcia, não quis centrar-me em questões protocolares ou de mera cortesia (que, apesar de tudo, fazem falta na política, que está tão pouco digna e elevada), nem sequer quis insinuar que um é muito melhor do que o outro.
Pelo contrário, sendo ambos da mesma área institucional (academia e ambos docentes nas mesmas duas universidades), sendo ambos, embora independentes, da mesma área política (social-democracia), o que leva o PS a rejeitar, durante meses, a primeira e, à quarta tentativa, sugerir o segundo, que tem as afinidades com a primeira que acabei de elencar, tendo desvantagem até em dois itens (idade e género)?
Quando, numa negociação, não aceitamos determinada personalidade (por razões várias e até atendíveis), é suposto, se formos sérios e competentes, apresentar alternativas bem diversas das que recusamos para que se perceba bem a coerência das nossas escolhas.
Em resumo, o PS (na prática, José Sócrates) quer indicar todos os titulares de órgãos do Estado, permitindo-se até recusar nomes de forma gratuita e apresentar outros que preenchem praticamente os mesmos critérios da personalidade rejeitada!
Repito, porque não serve Maria da Glória Garcia?
(comentários a "Jorge Miranda", por Jorge Ferreira, e "Contra o interesse público…", por Ana Paula Fitas", Eleições 2009, 29-5-2009)

3 comentários:

Unknown disse...

Penso que as questões colocadas por Núncio contêm os elementos-chave para a resposta que procuram. No que se refere ao que considera “destempo”, reside exactamente a tentativa de corresponder à urgência da resolução do problema que, no quadro do respeito pela institucionalidade democrática faz todo o sentido ser encarado por uma pessoa como o Professor Jorge Miranda como um problema de “serviço público” que se não deveria deixar bloquear nos termos de uma mera quezília partidária; no que se refere à Professora Maria da Glória Garcia penso que não é preciso especular muito mais além da simples constatação que, tal como se provou, o consenso que a sua candidatura obteria seria muito menor do que tinha (e teve) condições para alcançar… afinal, as regras democráticas não se esgotam no protocolo e o respeito pelas instituições, felizmente!, não é redutível a um eventual acto de cortesia.
(Ana Paula Fitas, 30-5-2009)

Unknown disse...

Caro Núncio,

Obrigado pelas suas palavras que subscrevo no que à elevação do nível e da dignidade do debate político, diz respeito.

A questão, tal como a coloca, é correcta do ponto de vista formal mas, penso que a experiência do Professor Jorge Miranda lhe permite um crédito de confiança por parte dos potenciais utentes dos serviços da Procuradoria de Justiça que a Professora Maria da Glória Garcia teria ainda que construir dado ser conhecida no meio académico e, eventualmente, político mas não, comparativamente, pela sociedade civil. De facto não sei se foi esta a razão objectiva pela qual o PS não apoiou desde o primeiro momento a sua candidatura mas, penso que o posso inferir nomeadamente pelo perfil inerente aos outros nomes que, no seu comentário, evoca: Freitas do Amaral, António Arnaut ou Laborinho Lúcio, que partilham essa imagem pública. A terminar, permita-me que esclareça que não considero critérios de mérito o género ou a idade mas sim, a competência, o humanismo, o rigor, a boa-fé e a empatia indispensáveis à construção social da confiança em que deve assentar a transparência das relações entre o Provedor de Justiça e os cidadãos.
(Ana Paula Fitas, 30-5-2009)

Unknown disse...

O cargo de Provedor de Justiça está institucionalmente bem definido, constituindo-se como uma reserva de recurso para os cidadãos numa área fragilizada da democracia, a saber, a Justiça… se o exercício do cargo tem conseguido transmitir a imagem necessária à sua indispensável divulgação é outra questão, tal como é outra questão ajuizar sobre as formas de gestão do desempenho destas funções, considerando que poderiam ser muitissimo mais exploradas e rentabilizadas. Nestes termos, privar a população do recurso a uma existência consagrada institucionalmente é, obviamente, limitar os Direitos Fundamentais do Cidadão e, consequentemente, sacrificar o interesse público. Quanto ao Professor Jorge Miranda, pela sensatez, a experiência, o saber, o rigor, a transparência e o sentido de responsabilidade cívica, enquanto qualidades atestadas pelo seu perfil, múltiplas vezes aferido publicamente, considero tratar-se de uma pessoa reconhecidamente dotada das competências requeridas para um melhor desempenho das funções em causa. Quanto à Professora Maria da Glória Garcia, cujo perfil técnico, humano e político é menos conhecido do que o do Professor Jorge Miranda e apesar da boa prestação na audição levada a efeito na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que acompanhei através do Canal Parlamento, era previsível que obtivesse um menor consenso pluripartidário no que à sua eleição para este cargo, diz respeito… ora, cientes da morosidade do processo e da urgência em o concluir, os diferentes quadrantes políticos deveriam ter tido a capacidade de ultrapassar quezílias menores da luta partidária pré-eleitoral… em nome do interesse público!
(Ana Paula Fitas, 30-5-2009)

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