"São Paulo, a megalópole do luxo kitsch:
"Ignorando a miséria, a capital económica do Brasil é o Quartel-General dos abastados, com os seus bares, os seus hotéis luxuosos, as suas boutiques com heliporto...
"(...) Com 35% do PIB brasileiro concentrado no Estado de São Paulo, a megalópole é mesmo uma capital do luxo, com as suas «Fashion Weeks» (semanas da moda), os seus parques semeados de obras de Oscar Niemeyer, o arquiteto do concreto curvado, e as suas bienais de arte contemporânea. A megalópole passou de 30.000 habitantes em 1870 para 18 milhões em 2005, tornando-se assim a terceira maior cidade do mundo, a mais importante do hemisfério sul. Fundada em 1554 por um pequeno grupo de jesuítas, ela possui hoje 2.578 arranha-céus.
"(...) Uma cidade extremada onde o dinheiro jorra aos borbotões. (...) Paraísos para os passeadores, [o]s antigos "jardins" são uma zona protegida do grande risco - seguranças (...) de terno preto ou azul escuro conversam em frente às lojas e aos restaurantes com os colegas motoristas e guarda-costas. Situado no coração desta cidade disparatada, este triângulo de ouro protege os afortunados da economia mundial e a clientela estrangeira. Boutiques de luxo, restaurantes de ementa "nouvelle cuisine" (...). Por exemplo, no Clube do Chocolate, na Rua Haddock Lobo, sem dúvida uma das mais caras do (...) imobiliário paulista, junto à Rua Oscar Freire, o equivalente tropical de uma Rua Saint-Honoré, em Paris.
"Em certos casos, ocorre que a riqueza não se sente à vontade num bairro por demais apertado como o dos Jardins e resolve mudar-se para bairros modernos e promissores. Uma prova desta tendência é a loja Daslu, com os seus 20.000 m2 de luxo absoluto, um "shopping-bunker" que migrou em 2005 do bairro de Vila Nova da Conceição para o vasto estaleiro do futuro núcleo de urbanismo futurista próximo da marginal Pinheiros, uma espécie de auto-estrada urbana que acompanha o rio, ultra poluído, do mesmo nome. Uma espécie de quadrado com colunas inspiradas na Grécia antiga que custou 50 milhões de dólares (...), a Daslu acolhe seus clientes privilegiados com fausto. Condutores trajando fraque e boné branco e preto, simpáticas e prestáveis empregadas de avental bordado, vendedoras "manequins" que vestem a marca da casa. Pode encontrar-se de tudo na Daslu: malas Vuitton, calças Dolce & Gabbana, sapatos Gucci, pulôveres Chanel, tudo importado. Perfumes, carros (Mini Cooper e Maserati), aparelhos de televisão de écran plasma, modelos de iates. Pode também chegar-se de helicóptero pelo telhado e refrescar-se no bar de champanhe projectado por David Collins, o arquitecto predilecto de Madonna.
"Do outro lado do rio Pinheiros, fica a favela do Coliseu, pobre entre as mais pobres, onde o rendimento mensal médio de um habitante não atinge sequer o preço do estacionamento [da Daslu]: 30 reais [cerca de 10 euros], uma tarifa que condiz com o padrão de riqueza da loja."
(Véronique Mortaigne, enviada especial a São Paulo, Le Monde)
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E andamos nós a discutir os limites da liberdade de expressão, quando milhões de pessoas no mundo nem sequer conseguem exprimir uma palavra, de tanta fome que passam ou de tanta tareia que apanham...
(artigo reescrito em Português de Portugal, a partir do texto original que me foi endereçado, gentilmente, por correio electrónico, por um amigo brasileiro)